"A demarcação das terras indígenas e a proteção de seus povos é tarefa inescapável do Estado brasileiro e exige o compromisso, de boa-fé, de todos os Poderes da República." - Nota Pública da Comissão Arns

Impunidade para execuções extrajudiciais

Paulo Sérgio Pinheiro 5 Jul 2019, 11:15 recorte-jornal.jpg

A Ordem dos Advogados do Brasil (Seção São Paulo) OAB e a Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese paulista estão desencadeando uma campanha “contra a impunidade dos crimes da Rota e de policiais militares no exercício de funções de policiamento civil”, nas palavras do advogado José Carlos Dias, membro da CJP.

Este é um trecho de um texto do saudoso Pedro Del Picchia , publicado na Folha de S. Paulo há 38 anos, em 1981. Para que os leitores entendam melhor a história, lembro que, depois do chamado “Pacote de abril”, a reforma constituinte outorgada em 1977, pelo general Ernesto Geisel, foi facultada aos estados a criação de uma “Justiça militar estadual” para processar e julgar crimes das polícias militares.

A reportagem da FSP continuava:

A nova redação [da Constituição Federal] propiciou ao [sempre prestimoso à ditadura] Supremo Tribunal Federal a revisão de uma sua antiga Súmula, a de nº 297 – [que previa submeter ao Tribunal do Júri todos os homicídios] – passando a atribuir caráter de crime militar a praticamente a todos os delitos cometidos por policiais militares.

Estabelecida a nova jurisprudência, esclarece o professor da Unicamp Paulo Sérgio Pinheiro, (...) o resultado é que “a polícia militar [de São Paulo] crê que a mais recente interpretação do STF lhes assegura a justiça ‘interna corporis’ (dentro da corporação), o que permite oferecer um respaldo integral a seus homens, mesmo em casos de execuções sumárias“.

Pinheiro cita ‘números alarmantes’ – (...) a ROTA [Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar, em SP] matou, segundo suas próprias estatísticas, 129 pessoas” — para concluir que existe na prática uma política deliberada de extermínio de criminosos, verdadeiros ou supostos”.

Os advogados José Castro Bigi, José Carlos Dias e Flávio Bierrenbach consideram unanimemente que a nova interpretação do STF fere o princípio da isonomia quando esta afirma que “todos são iguais perante a lei”.

Depois dos constituintes de 1988 manterem intacta a estrutura do sistema de segurança publica da ditadura, poucas mudanças ocorreram no campo da impunidade dos crimes da PM. As execuções extrajudiciais por policiais militares em 2017, em São Paulo, atingem o número de 687 mortes, demonstrando que o legado autoritário no sistema de segurança continua intacto .

A única mudança quanto àquela matéria foi uma lei proposta pelo deputado Hélio Bicudo, com apoio do ministro da Justiça, Nelson Jobim, no governo Fernando Henrique Cardoso, que transferiu para a Justiça comum o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, praticados por policiais militares e militares contra civis .

Mas 21 anos depois, ocorre um retrocesso, provocado pelo governo Temer, ao espírito do ”Pacote de abril”, com a Lei 13.491/2017, que transfere da Justiça comum para a Justiça Militar dos Estados e da União o julgamento de crimes dolosos de policiais militares e militares contra a vida.

Graças a essa lei, a morte, no Rio de Janeiro, em 2019, de dois civis, um músico e de um catador de papel, por militares do exército, está sendo julgada pela Justiça militar da União.