Os indígenas podem não ter dinheiro, mas não são pobres. E são hoje guardiões de nosso futuro. - Manifestação da Comissão Arns

Assassinato de jovens negros na Bahia: parceria supermercado e crime

Por André Alcântara e Paulo Sérgio Pinheiro 13 Mai 2021, 9:37 750_adolescente-atakarejo-tortura-furto-amaralina-salvador_2021512113121896.jpg

Bruno Barros, de 29 anos, e Yan Barros, 19, tio e sobrinho. No dia 25 de abril, os dois homens negros saíram do bairro onde vivem, em Fazenda Coutos, localizada na região “subúrbio/ilhas”, Nordeste da cidade de Salvador. O subúrbio periférico, com casas precárias e saneamento básico deficitário, não oferece oportunidade de renda ou emprego e apresenta alto índice de homicídios.

É moradia de trabalhadores de baixa renda, onde reina a precariedade de serviços públicos como escolas e unidades de saúde. Em 2010, 51% dos habitantes locais que tinham trabalho recebiam até um salário mínimo, e 21,5% recebiam de 1 a 3 salários mínimos. Pardos e pretos, categorias do censo, somam 90% daquela população.

Tio e sobrinho foram até o supermercado Atakadão Atakarejo, no bairro Amaralina, no Sul da cidade de Salvador, outra região com altas taxas de violência. O Atakadão Atakarejo integra uma rede de 23 lojas na Bahia, pertencente ao empresário Teobaldo Costa.

Na loja de Amaralina, Bruno e Yan foram acusados por seguranças e funcionários de tentar furtar cinco quilos de carne.

Até aqui, essa seria apenas mais uma história de segregação e criminalização da população negra, se, em seguida, funcionários do Atakadão Atakarejo não tivessem ido mais além, rumo à barbárie. Foi exigido que tio e sobrinho que pagassem R$ 700,00 pela mercadoria. Os dois ficaram em cárcere privado, enquanto ligavam para diversos familiares e amigos, em busca da referida quantia.

Desesperada pelo medo externado por Bruno, sua irmã tentou ajudar com R$ 200,00, mesmo sem entender o que estava acontecendo, Familiares acionaram o serviço policial, sem sucesso. No entanto, a diligência policial foi, sim, ao local. Mas apenas tempos depois, quando recebeu o comunicado um assalto ao supermercado – que, estranhamente, negou a ocorrência.

O que de fato aconteceu foi que os responsáveis pelo supermercado resolveram agir por conta própria, ilegalmente: entregaram os acusados de roubo para serem “justiçados” pela facção do tráfico de drogas local. Bruno e Yan foram torturados, mortos e seus corpos foram desfigurados pelos traficantes.

Para lidar com a tentativa de furto, os responsáveis da loja não recorreram às instituições policiais ou aos mecanismos legais de justiça. Mas perpetraram uma sucessão de crimes: manutenção em cárcere privado, extorsão, associação ao tráfico, coautoria do crime de tortura e homicídio.

No dia 1º de maio, uma nova vítima dessa parceria do supermercado Atakarejo da Amaralina com a quadrilha de tráfico denunciou a violência sofrida. Uma jovem relatou que foi torturada pelo tráfico, a mando do supermercado, após ter sido acusada de furto.

A polícia civil está realizando seu trabalho com notoriedade e empenho. Realizou prisões dos envolvidos, especialmente dos seguranças do supermercado, que negaram as acusações apesar de todas as provas existentes. Isso demonstra que o supermercado tem total responsabilidade sobre seus agentes e que a noticiada colaboração do supermercado com as investigações está posta à prova.

É inadmissível que empresas, à guisa de defender seu patrimônio por delegação ao crime, recorram a tortura e execução de jovens pobres e negros. Espera-se que as autoridades do governo e do sistema judiciário da Bahia não deixem impunes todos os envolvidos nessa barbaridade.